Livre para Amar
22/02/2010
Ao ouvir uma sinfonia, você se abre a cada nota, deleita-se com ela e depois a deixa passar para poder ouvir a seguinte. Não quer a permanência de nenhuma, pois no seu decurso harmônico, encontra-se a melodia, sempre nova e sempre fresca. Com o amor acontece a mesma coisa. Quando você se apega, a permanência destrói a beleza do amor. Coisifica-se e não flui com toda a grandiosidade e beleza.
Não existe casal nem amizade tão segura como a daqueles que sabem manter-se livres. O vínculo afetivo que se estabelece, cheio de respeito e gozo, é indestrutível, porque não se baseia em compromissos nem em obrigações, mas em uma opção livre que se renova a cada dia e se apoia na verdade de cada um.
Existem dois tipos de desejos ou dependências: o desejo cujo cumprimento depende do que eu considero a minha felicidade e o desejo cujo cumprimento não depende a minha felicidade. O primeiro é uma escravidão, um desassossego, pois depende de seu cumprimento ou da sua falta o fato de ser feliz ou infeliz. O segundo deixa uma alternativa aberta: caso se cumprir, fico feliz, se não, procuro outras compensações. Como aconteceu com um senhor quando aguardava sua mulher dar a luz em uma clínica. Depois de longa espera, finalmente chega a enfermeira e lhe pergunta: o senhor prefere menino ou menina? Ele responde: “Menino, claro”. Mas, ao anunciar-lhe que nascera uma menina, ele responde tranquilamente: “Bem, essa era a outra alternativa!”. Assim, ficou feliz, pois não tinha jogado tudo em uma só carta.
Existe ainda outra opção que nunca deixa você desiludido. Uma forma mais realista de viver os desejos: como estímulos que preparam você para desfrutar das surpresas de um jogo, no qual o que menos importa é perder ou ganhar, pois a alegria está no jogo em si. Um provérbio oriental diz: “quando o arqueiro dispara gratuitamente, o faz com a sua habilidade”. Isso é uma grande verdade, pois, se disparar esperando uma medalha de bronze, ficará bastante nervoso. Se disparar para ganhar a de ouro, ficará alucinado pensando no prêmio. É provável que veja dois alvos em vez de um só. Pensaria mais em ganhar do que em disparar. Realmente a sua habilidade não teria mudado, mas as suas expectativas, pois desejar o prêmio faz minguar a destreza. Isso acontece frequentemente conosco nesta sociedade competitiva: o desejo de ganhar ofusca o desejo de disparar. A necessidade de triunfar reduz a nossa energia e lucidez ao desejo do aplauso.
O desejo marca sempre uma dependência. De certa forma todos dependemos de alguém. O padeiro, o leiteiro, o agricultor, por exemplo, são necessários a nossa organização. O ruim é depender de alguém ou de algo para ser feliz. Por isso os apegos tornam você vulnerável, pois depender de outra pessoa para ser feliz é, além de prejudicial, uma armadilha para outra pessoa e um perigo, pois você persegue algo contrário à vida e à realidade. Com certeza vai se dar mal, sofrer muito e, ao mesmo tempo, você fará infeliz aquele que crê amar.
Mas cremos no amor que nunca falha, porque sempre confia. Então poderá dizer livremente ao amado: não tenho medo de perdê-lo, porque você não é objeto de minha propriedade nem da propriedade de ninguém. Amo você do jeito que você é, sem apegos, sem medos, sem condições, sem egoísmo, tentando não o absorver. Amo-o livremente porque amo a sua liberdade tanto como a minha. Posso lhe garantir que isto é amor e esta forma de amar produz um gozo sem limites.
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